"NOS dias que correm, voltou a ser moda citar Karl Marx. Mas este filósofo alemão não falou apenas da luta de classes. Ele previu também que um dia a máquina capitalista se deterá por si própria, que a sua dinâmica se exaurirá. Porquê? O modo de produção capitalista de mercadorias contém, à partida, uma contradição interna, uma autêntica bomba ao retardador situada nos seus próprios fundamentos. Só é possível fazer frutificar o capital e, por conseguinte, acumulá~lo, explorando a força do trabalho. Mas, para gerar lucro ao empregador, o trabalhador tem de estar apetrechado com as ferramentas necessárias, e hoje com tecnologias de ponta. Daí resulta uma corrida contínua - ditada pela concorrência - à utilização de tecnologias. O primeiro empregador a recorrer a novas tecnologias fica sempre a ganhar, porque os seus operários produzem mais do que os que não dispõem desta ferramenta. Mas o sistema no seu todo perde, porque as tecnologias substituem o trabalho humano.
O valor de cada mercadoria singular contém, pois, uma cota-parte cada vez mais exígua de trabalho humano - que é, no entanto, a única fonte da mais valia e, portanto, do lucro. O desenvolvimento da tecnologia diminui os lucros na sua totalidade. Contudo, durante um século e meio, o alargamento da produção de mercadorias, à escala mundial, foi capaz de compensar esta tendência para a diminuição do valor de cada mercadoria.
Desde os anos 70 do século passado, este mecanismo - que outra coisa não era senão uma fuga para a frente - está bloqueado. Pradoxalmente, os ganhos de produtividade permitidos pela microelectrónica fizeram o capitalismo entrar em crise. Eram necessários investimentos cada vez mais vultuosos para pôr a trabalhar os poucos operários que tinham sobrado segundo os padrões de produtividade do mercado mundial. A acumulação real do capital ameaçava estancar. É então que o 'capital fictício', como lhe chamou Marx, ganha livre curso. O abandono da convertibilidade do dólar em ouro, em 1971, retirou a última válvula de segurança, o último ancoradouro à acumulação real. O crédito mais não é do que uma antecipação dos lucros futuros esperados. Mas quando a produção de valor, logo de sobrevalia, estagna na economia real (o que não tem nada a ver com a estagnação na produção de coisas - mas o capitalismo gira à volta da produção de mais-valia e não de produtos enquanto valores de utilização), só a finança permite aos proprietários de capital realizarem os lucros que se tornaram impossíveis de obter na economia real. A escalada do neoliberalismo, a partir de 1980, não foi uma manobra suja dos capitalistas mais ávidos, um golpe de Estado preparado com a ajuda de políticos complacentes, como quer a 'esquerda radical'. Pelo contrário, o neoliberalismo foi a única forma de prolongar um pouco mais o sistema capitalista, cujos fundamentos ninguém, seriamente, queria pôr em causa, quer à direita, quer à esquerda. Graças ao crédito, um grande número de empresas e de indivíduos conseguiu manter durante muito tempo uma ilusão de prosperidade."
Anselm Jappe
O valor de cada mercadoria singular contém, pois, uma cota-parte cada vez mais exígua de trabalho humano - que é, no entanto, a única fonte da mais valia e, portanto, do lucro. O desenvolvimento da tecnologia diminui os lucros na sua totalidade. Contudo, durante um século e meio, o alargamento da produção de mercadorias, à escala mundial, foi capaz de compensar esta tendência para a diminuição do valor de cada mercadoria.
Desde os anos 70 do século passado, este mecanismo - que outra coisa não era senão uma fuga para a frente - está bloqueado. Pradoxalmente, os ganhos de produtividade permitidos pela microelectrónica fizeram o capitalismo entrar em crise. Eram necessários investimentos cada vez mais vultuosos para pôr a trabalhar os poucos operários que tinham sobrado segundo os padrões de produtividade do mercado mundial. A acumulação real do capital ameaçava estancar. É então que o 'capital fictício', como lhe chamou Marx, ganha livre curso. O abandono da convertibilidade do dólar em ouro, em 1971, retirou a última válvula de segurança, o último ancoradouro à acumulação real. O crédito mais não é do que uma antecipação dos lucros futuros esperados. Mas quando a produção de valor, logo de sobrevalia, estagna na economia real (o que não tem nada a ver com a estagnação na produção de coisas - mas o capitalismo gira à volta da produção de mais-valia e não de produtos enquanto valores de utilização), só a finança permite aos proprietários de capital realizarem os lucros que se tornaram impossíveis de obter na economia real. A escalada do neoliberalismo, a partir de 1980, não foi uma manobra suja dos capitalistas mais ávidos, um golpe de Estado preparado com a ajuda de políticos complacentes, como quer a 'esquerda radical'. Pelo contrário, o neoliberalismo foi a única forma de prolongar um pouco mais o sistema capitalista, cujos fundamentos ninguém, seriamente, queria pôr em causa, quer à direita, quer à esquerda. Graças ao crédito, um grande número de empresas e de indivíduos conseguiu manter durante muito tempo uma ilusão de prosperidade."
Anselm Jappe
Etiquetas: Economia
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial