27.10.08

"PREVISIVELMENTE com a crise financeira internacional o Partido Comunista Português redescobriu que o 'socialismo' era uma 'alternativa necessária e possível' ao horror e à miséria em que o mundo vive hoje. Uma tese do próximo Congresso, o XVIII, vai reafirmar isso mesmo e, melhor ainda, explicar com a autoridade que lhe assiste as razões do colapso da URSS e das 'Repúblicas Populares de Leste'. Isto - que parece pouco e quase cómico (se não fosse trágico) - basta para demonstrar o atraso cumtural, político e económico do país. Não há na Europa nenhuma instituição remotamente parecida com o PCP e, no resto do mundo, só a China (não se percebe porquê), o Vietname, o Laos, Cuba e a Coreia do Norte merecem a aprovação da ortodoxia indígena.
A história passou, mas, significativamente, não passou por aqui. O PC está como estava em 1974. O colapso do 'socialismo real' não o diminuiu nem o fez tremer. A coisa, segundo o XVIII Congresso, foi um pequeno acidente de percurso: o resultado da 'traição dos altos responsáveis do partido e do Estado' (presumo que da URSS e não da Polónia ou da Checoslováquia); do 'abandono de posições de classe e de uma estreita ligação com os trabalhadores', da 'claudicação perante a chantagem do Ocidente', da 'penetração em profundidade da ideologia social-democarata', e 'da rejeição do heróico património dos comunistas'. Por outras palavras, excepto por meia dúzia de erros, que não afectavam nada de essencial ou, mais precisamente, nada de material, o sistema funcionava.
O PC não sabe, ou já se esqueceu, que desde 1970-71 o Ocidente subsidiava o 'socialismo real' em nome da estabilidade e da paz. Na véspera da catástrofe de 1988, as 'Repúblicas Populares', incluíndo a Jugoslávia e tirando a Roménia, deviam ao Ocidente 95,6 biliões de dólares (a preços da época); uma quantia colossal e sempre a crescer, com que financiavam o seu consumo interno. O problema é que, apesar dessa delirante estratégia, as populaões de Leste continuavam numa situação de atraso e de pobreza relativa. Ironicamente, a perenidade do PC também assenta no atraso e na pobreza relativa dos portugueses, que nenhuma 'modernizzação', 'reforma' ou subsídio da 'Europa' até agora conseguiu moderar ou eliminar. O PC não muda (ou não se extingue), porque a sociedade não muda, ou, pelo menos, não muda o suficiente. É um arcaísmo? Talvez. Como Portugal.
Vasco Pulido Valente, Público, 27/9/08

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