Indignidades
NUMA região que se dá ao luxo de agraciar os seus residentes com subvenções anuais (cerca de 5000 patacas para residentes permanentes e 3000 para não permanentes), não se descortina o motivo que leva à desprotecção de milhares de trabalhadores imigrantes que laboram na RAEM ao abrigo de autorizações de residência precárias, conhecidas como “blue cards”. São, na grande maioria, mulheres de origem indonésia e filipina, que trabalham como domésticas. As condições em que o fazem ficaram bem patentes num colóquio organizado domingo pela “Macau Live Net Association”, uma Organização Não Governamental promovida por pessoas de Macau, que tenta alertar para estas situações. Naquele evento, o deputado Ng Kuok Cheong pôde ouvir muitas da dificuldades extraordinárias por que estas mulheres passam.
A ausência de salário mínimo em Macau leva a que a exploração não tenha limites. A exiguidade dos salários é tal que as trabalhadoras dizem receber mensalmente, em média, 2500 patacas (para as domésticas ‘internas’) a 3000 (para as que não residem em casa do patrão). Acresce a isto o facto de que muitas trabalhadoras domésticas internas acabam por ter que estar em serviço a todas as horas do dia, não tendo definido um horário de trabalho ou um regime de pagamento de horas extraordinárias. Escusado será dizer que não têm direito a qualquer período legal de férias. Isto não lhe faz lembrar os tempos da escravatura? Eu chamar-lhe-ia escravatura moderna.
Mas há muito mais: Para arranjarem trabalho em Hong Kong ou em Macau, estas mulheres chegam a ter que pagar uma comissão de 10 salários. Ou seja, só passam a receber o seu escasso provento depois de terem trabalhado quase um ano para a agência. É certo que estas agências operam muitas vezes a partir dos países de origem das imigrantes – embora com ramificações na RAEM -, mas não será possível regular de alguma forma a sua actividade?
Já a trabalhar em Macau, estas trabalhadoras confrontam-se com múltiplas dificuldades. Há casos em que os patrões retêm indevidamente os seus “blue cards”, coarctando dessa forma a sua liberdade de movimentos. Noutras situações, os salários são pagos com semanas e meses de atraso. No domínio da saúde, o cenário não é melhor. Para dar um exemplo, os imigrantes que não possuam cartão de residente de Macau têm que pagar mais duzentos por cento do que os residentes se quiserem fazer um teste de detecção do HIV.
O “excesso de permanência” foi outro contratempo denunciado pelas mulheres da União de Trabalhadores Imigrantes da Indonésia. De facto, os imigrantes portadores de “blue card” são obrigados a esperar seis meses sempre que deixam um trabalho. Só passado esse período podem voltar a ter um contrato de trabalho, situação que, associada ao facto de terem apenas dez dias para permanecerem no território findo o contrato, leva a que tenham que sair para outro país ou para Hong Kong.
Face a todas estas peculiaridades e irregularidades, o deputado Ng Kuok Cheong reconhece que a protecção de portadores de “blue card” relativamente a eventuais abusos de patrões sem escrúpulos ou de agências “é muito limitada”. “Se o passaporte ou o ‘blue card’ estiverem retidos pelo empregador, os imigrantes podem fazer queixa na polícia. O problema é que há um conflito de interesses, visto que quem está numa situação de excesso de permanência será duplamente penalizado se fizer queixa, pela própria polícia e pelo patrão, que provavelmente as despedirá”, disse o deputado às imigrantes.
A nova lei relativa ao trabalho imigrante deverá ser aprovada ainda nesta legislatura. Ng Kuok Cheong exortou todas as associações de imigrantes a darem sugestões sobre o projecto de lei “o mais cedo possível”. Será importante que as associações e a sociedade civil se pronunciem. Este modelo de exploração do trabalho fará parte do caminho da “harmonia”, que por aqui tanto se propagandeia?
Autor: P.B./Fotos: António Falcão
A ausência de salário mínimo em Macau leva a que a exploração não tenha limites. A exiguidade dos salários é tal que as trabalhadoras dizem receber mensalmente, em média, 2500 patacas (para as domésticas ‘internas’) a 3000 (para as que não residem em casa do patrão). Acresce a isto o facto de que muitas trabalhadoras domésticas internas acabam por ter que estar em serviço a todas as horas do dia, não tendo definido um horário de trabalho ou um regime de pagamento de horas extraordinárias. Escusado será dizer que não têm direito a qualquer período legal de férias. Isto não lhe faz lembrar os tempos da escravatura? Eu chamar-lhe-ia escravatura moderna.
Mas há muito mais: Para arranjarem trabalho em Hong Kong ou em Macau, estas mulheres chegam a ter que pagar uma comissão de 10 salários. Ou seja, só passam a receber o seu escasso provento depois de terem trabalhado quase um ano para a agência. É certo que estas agências operam muitas vezes a partir dos países de origem das imigrantes – embora com ramificações na RAEM -, mas não será possível regular de alguma forma a sua actividade?
Já a trabalhar em Macau, estas trabalhadoras confrontam-se com múltiplas dificuldades. Há casos em que os patrões retêm indevidamente os seus “blue cards”, coarctando dessa forma a sua liberdade de movimentos. Noutras situações, os salários são pagos com semanas e meses de atraso. No domínio da saúde, o cenário não é melhor. Para dar um exemplo, os imigrantes que não possuam cartão de residente de Macau têm que pagar mais duzentos por cento do que os residentes se quiserem fazer um teste de detecção do HIV.
O “excesso de permanência” foi outro contratempo denunciado pelas mulheres da União de Trabalhadores Imigrantes da Indonésia. De facto, os imigrantes portadores de “blue card” são obrigados a esperar seis meses sempre que deixam um trabalho. Só passado esse período podem voltar a ter um contrato de trabalho, situação que, associada ao facto de terem apenas dez dias para permanecerem no território findo o contrato, leva a que tenham que sair para outro país ou para Hong Kong.
Face a todas estas peculiaridades e irregularidades, o deputado Ng Kuok Cheong reconhece que a protecção de portadores de “blue card” relativamente a eventuais abusos de patrões sem escrúpulos ou de agências “é muito limitada”. “Se o passaporte ou o ‘blue card’ estiverem retidos pelo empregador, os imigrantes podem fazer queixa na polícia. O problema é que há um conflito de interesses, visto que quem está numa situação de excesso de permanência será duplamente penalizado se fizer queixa, pela própria polícia e pelo patrão, que provavelmente as despedirá”, disse o deputado às imigrantes.
A nova lei relativa ao trabalho imigrante deverá ser aprovada ainda nesta legislatura. Ng Kuok Cheong exortou todas as associações de imigrantes a darem sugestões sobre o projecto de lei “o mais cedo possível”. Será importante que as associações e a sociedade civil se pronunciem. Este modelo de exploração do trabalho fará parte do caminho da “harmonia”, que por aqui tanto se propagandeia?
Autor: P.B./Fotos: António Falcão
1 Comentários:
http://bairrodooriente.blogspot.com/2009/08/so-com-locais-nao-vamos-la.html
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